Umbanda do futuro



Por Andréa Deren Destefani 

Uma das mais importantes notícias da semana foi muito pouco divulgada: o governo americano destinará três bilhões de dólares ao estudo das sinapses  que ocorrem em nosso cérebro, mapeando o que ocorre a cada memória que temos, a cada informação que recebemos. Dentro de dez anos poderemos desvendar um pouco do quem somos, além de ter condições de ter uma infinidade de possibilidades de cura. Enquanto isto não acontece,gostaria de levá-los a uma tempestade mental, digna de uma filha de Yansã.

Lendo "O Dogma de Cristo" de Erich Fromm, publicado em 1930 as minhas sinapses quase entraram em colapso. Não é um livro que discute o aspecto espiritual, mas faz uma análise psicossocial do fenômeno e não há como não traçar um paralelo com a Umbanda. 

Nos primeiros cem anos do cristianismo, a religião era praticada pelos membros de classe mais baixa, de forma quase secreta, pois a perseguição que sofriam era muito grande. A comunidade era unificada apenas pelo laço comum da fé,esperança e amor, o que os dava uma liberdade de ação, pela despreocupação com instituições e fórmulas. 
Naquela irmandade cristã primitiva era comum a assistência econômica e o apoio mútuos, que foi essencial para o desenvolvimento da religião.Como se sentiam peregrinos e estranhos na terra, não havia necessidade de instituições permanentes.Não é o posto que faz a pessoa, mas a pessoa que prestigia o posto.E eles não precisavam disto.

A princípio o cristianismo foi uma atitude revolucionária, contra a pressão e opressão dos governantes, e do próprio judaísmo que era dividido em castas e elitizado. A partir do seu segundo século o cristianismo começou com o apoio de pessoas de pessoas mais intelectualizadas e com mais poder econômico. Aos poucos os governantes começaram a ver no cristianismo também uma excelente ferramenta de controle da população que acreditava que só por bons atos se chegaria ao paraíso espiritual. 

Assim começou a formação de uma hierarquia centralizada, começaram a formular questões de ordem e ingresso, fazendo que muito se perdesse ao longo de todos estes séculos da idéia original.
A idéia original da Umbanda é que o acesso ao mundo espiritual e do mundo espiritual para nós pode ser feito de maneira simples e direta. Uma religião de consolo, de luta e de cura. Uma religião em que os desvalidos, o que estão à margem da sociedade não ficariam sem uma palavra, uma mão forte que os elevasse. Nasceu justamente no seio do espiritismo que apregoava um nível intelectual mais alto para se ter acesso aos seres de luz. 

Nos primeiros 100 anos da Umbanda, fomos perseguidos, ameaçados, presos. Nos unimos em fé, caridade e esperança e ultrapassamos o primeiro século a salvo. Mas o que será de nós nos próximos cem anos? Preocupa-me de sobremaneira a possibilidade de acreditarmos que precisamos de uma hierarquia unificada, que por consequência será ditatorial. Hierarquia dentro de um terreiro é essencial, até por uma questão de segurança e organização, mas com limites no entendimento de seu poder. Não podemos nunca esquecer que a maioria das entidades que nos protegem foram escravos de alguma forma, para que hoje nos passem noções de liberdade real. 

A verdadeira beleza da Umbanda está na multiplicidade de rituais e a possibilidade que nos dá de servi-la onde ela nos chamar. E se há este "chamamento" é porque através do nosso potencial, poderemos agir de uma forma mais consistente na fé, caridade e amor ao próximo. 
Somos todos iguais e podemos ser livres se tivermos a consciência das limitações que temos ,assim como as têm também nossos pais e mães de santo, para podermos continuar vivenciando uma religião com alegria e vida longa. Saravá!

Fonte: http://coisasdecasados.blogspot.com.br

Comentários

Alvaro disse…
Ótimo comentário.
Vejo o futuro da Umbanda, diretamente vinculado à quebra dos vínculos com o sincretismo religioso, pois há de se firmar princípios e conceitos, para que não sejamos empurrados à ditadura hierárquica e venhamos a falar sobre coisas incompatíveis, tais como: Milagres, aparições e sobrenatural.

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